AS BELAS E O FERA

10/12/2017

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AS BELAS E O FERA
em dezembro 10, 2017


 


FOTO: ROBERTO MACÊDO/ARQUIVO PESSOAL
ENTREVISTA ROBERTO MACÊDO


AS BELAS E O FERA


Para o missólogo, autor da biografia de Martha Vasconcellos (Miss Universo 1968), a beleza “é a coisa mais importante no planeta Terra” e as cifras geradas pela indústria dos concursos de misses estão aí para provar isso


POR MÁRCIO WALTER MACHADO


Natural de Rio Real (BA), o jornalista, relações públicas da Prefeitura Municipal de Salvador, assessor de imprensa, autor, arquiteto, empreendedor, blogger e missólogo, Roberto Macêdo, não apenas é multi-tasked, mas também é a maior autoridade brasileira em concursos de beleza. Ele recebeu o NEWSBASTIDORES na semana anterior ao Miss Universo 2017, e falou sobre suas expectativas para o certâmen ocorrido no último dia 26 de novembro, e a importância política, cultural e de empoderamento feminino dessa indústria que gera bilhões de dólares todos os anos.


Como começou sua paixão pelos concursos de beleza?
Por incrível que pareça, através da Geografia. Nós tínhamos uma coleção de enciclopédias em casa que eu adorava ler. Por isso, desde os sete, oito anos de idade eu sabia o Mapa Mundi de cor, de maneira que as pessoas em Rio Real me sabatinavam na rua, todas as vezes que me viam passar, perguntando qual a capital desse ou daquele país, onde ficava tal e tal cidade, e eu sempre tinha a resposta na ponta da língua. Um dia, minha irmã chegou em casa com duas revistas cujas capas traziam mulheres lindas vestidas como rainhas, representando seus países de origem num concurso que escolhia quem era a mais bonita do mundo. Eu sabia tudo daqueles lugares de que as revistas falavam e a ideia de escolher a mais bonita entre aquelas moças me fascinou. A partir dali, eu comecei a ler muito sobre os concursos, a colecionar revistas e recortes de jornais que as pessoas me davam, e não perdia de ver nenhuma disputa na TV, ou, quando a transmissão ficava muito ruim, ouvir pela Rádio Sociedade da Bahia.


Os concursos de miss eram muito populares então?
Sim. Eram muito divulgados e as pessoas paravam o que estavam fazendo para assisti-los. Isso se intensificou em 1968, quando Martha Vasconcellos ganhou o Miss Universo, de maneira que, mesmo no início dos anos 70, ainda pairava no ar a sensação de vitória, de vingança por Martha Rocha ter perdido o título uma década antes para uma americana e esse título ter sido dado a nós por outra baiana igualmente chamada Martha. Há também a questão dos Diários e Emissoras Associados, de Assis Chateaubriand, terem sido a maior rede de comunicações na América Latina e grande popularizadora do concurso entre nós através de programas de TV e da revista Cruzeiro.


Nessa mesma época o movimento feminista ganhava corpo. Foi ele o responsável pelo descrédito do certâmen no Brasil?
O problema é que, no Brasil, o auge dos concursos de miss correspondeu ao auge dos Diários e Emissoras Associados, que eram seu grande divulgador pela TV e pela revista Cruzeiro. Para você ter uma ideia da dimensão da influência deles, a revista Cruzeiro chegou a vender um milhão de exemplares nas bancas! Isso foi um marco, porque as pessoas não tinham tanta facilidade de locomoção como têm agora e a circulação da mídia impressa era muito menor do que hoje; em Rio Real, por exemplo, nós não tínhamos bancas de revistas, as pessoas vinham a Salvador ou iam a Aracaju comprar os novos exemplares. Daí, com a morte de Chateaubriand e o fechamento da TV Tupi e da revista Cruzeiro, o concurso perdeu o prestígio. Pois não tinha quem fizesse resistência aos ataques e às difamações que, na maior parte das vezes, as feministas faziam aos concursos.


O desprestígio foi global?
De jeito nenhum. O concurso brilha nos mais variados países e gera receitas bilionárias - não é à toa que Donald Trump foi dono do concurso por duas décadas. No final dos anos 60, as feministas atacaram o Miss América com bombas de efeito moral, queimaram sutiãs, fizeram uma campanha imensa de difamação que chegou até nós, mas o resultado em termos globais não foi como no Brasil. Aqui, diferentemente de outros lugares, por causa da decadência do Diários e Emissoras Associados, não houve resistência que batesse de frente a esses ataques. No entanto, em países como o Japão, a Espanha, Israel, a Itália, a Colômbia, a Venezuela, Porto Rico, a França, isso para citar só alguns, os concursos se estabeleceram como tradição; nas Filipinas o concurso de misses é como se fosse a Copa do Mundo. Para o Miss Universo, que será no dia 26, em Las Vegas (EUA), os ingressos estão esgotados, e o teatro onde acontecerá o evento tem mais de 8 mil lugares.


Ainda assim há quem fale mal e diga que os concursos de beleza coisificam a mulher e que a idiotizam, emburrecem-na. Por quê?
Emburrecidos são aqueles que falam essas coisas. Os concursos de beleza sempre empoderaram as mulheres, fizeram delas embaixadoras, relações públicas, capacitaram-nas politicamente com a vivência das viagens e compromissos oficiais pelo mundo inteiro. Por exemplo, a Miss Universo de 1961, Marlene Schmidt, era engenheira eletrônica; Irene Saéz (Miss Universo 1981), estudava Engenharia Civil quando foi Miss; depois ela estudou Ciências Políticas e se tornou prefeita de Caracas (Venezuela), fez uma administração fantástica, foi reeleita com 92% dos votos, batendo 16 outros candidatos, e só não foi presidente da Venezuela porque, na disputa com Hugo Chavez, ela aceitou o apoio do Copei, um partido de extrema direita, e o povo não aceitou a aliança. Mas, antes disso, ela estava à frente de Chavez em todas as pesquisas. A Miss EUA 2017 é cientista nuclear. Isso citando apenas três exemplos. Há as misses que se tornaram atrizes, cantoras, e as que se embrenharam pelas diversas áreas profissionais, para quem os concursos de beleza foram apenas uma plataforma de lançamento.


Kara McCullough, a Miss EUA 2017, que está entre as top 10 para o Miss Universo, é negra. Diante do fato de a esmagadora maioria das campeãs serem fenotipicamente europeias, você acha que está havendo alguma política de reparação?
Eu acho que a questão não é étnica. A questão é elegermos a mais bonita. Por exemplo, no ano passado eu me apaixonei por Raíssa (Santana) quando ela ganhou o Miss Umuarama e foi Miss Brasil. Ela é negra, mas podia ser branca, asiática, de qualquer outra cor - a questão é que ela é bonita. Eu acho é que os jurados não podem ser preconceituosos e pensar que a beleza está numa cor, isso é bobagem. É verdade que o Miss América tinha uma cláusula, até a década de 1940, segundo a qual apenas mulheres de ascendência anglo-saxônica podiam participar do concurso. Mas a regra caiu, e, assim que isso aconteceu, foi eleita uma judia, Bess Myerson. Em 1959, Akiko Kojima, do Japão foi a Miss Universo, a primeira asiática a vencer o concurso. Houve até protesto de uma leitora da revista Manchete, indignada com a escolha da japonesa, à qual Henrique Pongetti, um grande articulista da época, respondeu com uma crônica reforçando justamente a ideia de que a beleza não é questão de raça, ela está em qualquer cor.


Apesar disso, Pia Alonzo, das Filipnas, tirou a coroa da favorita Ariadna Gutierrez, da Colômbia, num episódio bastante controverso, em 2015.
Ariadna deveria ter sido a Miss Universo de 2015. Quando Steve Harvey anunciou que ela havia ganhado eu pulei de alegria. Foi emocionante vê-la sendo coroada pela prima, a Miss Universo 2014, Paulina Vega. Mas aí depois veio a frustração.


Com a escolha de Monalysa Alcântara como Miss Brasil 2017, a questão racial por aqui ainda se mostra muito forte?
Essa menina vem enfrentando uma barra nas redes sociais. Mas eu acredito que a questão não é tanto por ela ser negra, é mais por ser nordestina. Porque, no ano passado, não vi esse preconceito com Rayssa Santana, que, sendo negra, mesmo nascida em Itaberaba (BA), representou o Paraná. Acredito que a questão racial é muito pontual, não vejo como uma questão da sociedade, mas como um problema de pessoas com a mente limitada, tanto assim que, por dois anos seguidos, nós temos duas misses negras.


Há, no Brasil, uma polarização entre misses brancas e negras?
O concurso está aberto para todas. Gessy Gesse, a viúva de Vinícius de Moraes, que era índia, ficou em terceiro lugar no Miss Bahia de 1956; em 1996 tivemos uma miss do Mato Grosso do Sul, Ana Karina Homa, de origem asiática. Tivemos também algumas candidatas de origem asiática, de São Paulo, mas eu não sei por que elas não se inscrevem mais.


Na Bahia, não vemos muitas candidatas negras. Por quê?
Aqui na Bahia, em 2015, houve um movimento na internet, um abaixo-assinado, pedindo a participação de mais negras no Miss Bahia, mas elas não se inscreveram. Eu fiz o concurso de Miss Brasil na Bahia por três anos e houve vezes que a gente não teve uma negra sequer inscrita. Lembro que em 2005 a menina que ganhou era branca, cabelos pretos; as outras duas eram loiras, uma de olhos verdes, a outra de olhos azuis. Essa segunda, Pâmela Bório, acabou sendo a primeira-dama da Paraíba.


Quais os critérios de beleza para se eleger a mulher mais bonita do universo?
Eu acho que é uma coisa muito simples. Se passar alguém aqui, você sabe se esse alguém é bonito ou feio. Se você quer saber se uma menina é bonita, deixe-a caminhar no shopping ou na rua e observe a reação das pessoas, porque as pessoas reagem à beleza. Tem um movimento no planeta para querer descaracterizar isso, essas pessoas são hipócritas. Pois todos procuram a namorada mais bonita, a casa mais bonita, querem ter os filhos mais bonitos. Todo mundo quer tudo mais bonito, logo, a beleza é de suma importância. No entanto, eu não faço apologia da beleza por si só; eu digo sempre em minhas palestras que a beleza é a coisa mais importante que existe no planeta Terra, ela abre todas as portas para você entrar, agora, para permanecer lá dentro, é preciso ter algo além de ser bela. Já para falar de padrões instituídos, havia a regra da candidata ter a partir de 1,75 de altura e as medidas 90x60x90. Hoje não se fala mais disso. O Miss Universo conserva a altura, mas não dá mais medida de corpo.


Se fosse assim em 1954, Martha Rocha teria sido a Miss Universo?
A questão de Martha Rocha foi política, não teve nada a ver com medidas corporais. Usaram as proporções como desculpa, pois, se você reparar bem, Miriam Stevenson, que se tornou Miss Universo, era tão “cadeiruda” quanto nossa baiana. Entretanto, Martha Rocha era infinitamente superior à americana, e essa superioridade dela, apesar do sentimento de frustração que ficou, fez o brasileiro se orgulhar novamente numa época conturbada em nossa história.


Em 2015, você lançou, para a coleção Gente da Bahia, projeto da Câmara Legislativa do Estado, a biografia de Martha Vasconcellos, Miss Universo 1968. Porque falar da alegria e não da frustração nacional?
A ideia inicial era que o livro fosse sobre as duas (Martha Vasconcellos e Martha Rocha). Mas eu comentei com o Paulo Bina (chefe da Editoria de Comunicação Social da Câmara) que já haviam feito uma biografia da Martha Rocha. Além disso, não havia uma justificativa para pôr as duas num mesmo livro, uma vez que elas não têm vivência uma com a outra, não são amigas, não têm uma história em comum além do concurso de miss. E aí resolvemos falar apenas de Martha Vasconcellos. O resultado é que o livro foi um sucesso. A edição se esgotou na noite de lançamento e exemplares foram enviados para o mundo inteiro.


Você conta em seu livro que Martha Vasconcellos recebeu uma comitiva de senhoras em sua casa lhe pedindo que tomasse parte no concurso de beleza que, posteriormente, lhe abriria as portas do Miss Universo. Assim, a maneira como aconteciam a candidatura das moças, à época, parecia bastante despretensiosa. Hoje há uma profissionalização das misses?
Hoje em dia são as misses que vão à procura do concurso já com uma bagagem no currículo. A Miss Rio Grande do Sul, por exemplo, é modelo profissional desde a adolescência. Na época de Marta era diferente. Sua preparação veio de um presente que ela ganhou quando completou 15 anos: um curso de etiqueta na Sociedade Civil de Intercâmbio Literário e Artístico (Socila), que toda moça de família fazia. Basicamente, era aprender a caminhar, se maquiar, comportar-se à mesa. Hoje em dia as meninas, que geralmente já tem algum currículo, passam o ano se preparando, fazem cirurgias, põem silicone, etc.


Mas isso não é burlar a ideia inicial de valorização da mulher e ter um consequente esvaziamento desse sentido com o estabelecimento de padrões de beleza irreais para a maioria?
Seria, mas ninguém proíbe, ou melhor, quase ninguém. Acredito que a França e a Itália proíbam, e algum outro país que não me recordo agora. As pessoas estão em busca do padrão e, mesmo as meninas que não pensam em concursos de miss, ajeitam aqui e ali. Se alguém tem seios pequenos, põe silicone; outras, fazem uma lipo; outras, ajeitam o nariz, a orelha. Então, fica difícil encontrar alguém que não tenha feito alguma coisa. Mesmo a academia já é uma intervenção.


Quais são as possibilidades reais de Monalysa Alcântara trazer a coroa de Miss Universo 2017?
A miss Piauí, em minha opinião, tem uma beleza mediana. Eu acho que ela tem estampa, é alta, mas não tem aquele tipo de beleza que arrasta multidões, como Martha Vasconcellos, Oxama Federova (Miss Universo 2002), e Irene Saéz – as três mulheres mais lindas que eu já vi na vida. Mas ela tem outros encantos. Eu ainda não conheço a Miss Piauí pessoalmente, mas quem a conhece me diz que ela brilha tanto que você a acha maravilhosa, que ela tem um magnetismo pessoal fantástico, de tal forma que ao falar no Miss Brasil todos foram tragados por ela. Mesmo não falando inglês, se Monalysa conseguir demonstrar esse mesmo carisma lá em Las Vegas, ela pode conquistar os corações dos jurados.


Você tem favoritas?
Tenho algumas. A minha número 1 é a Miss Israel, Adar Gandelsman. Ela é filha de pais pernambucanos. Se ela ganhasse, seria uma grande ironia, porque Pernambuco nunca teve uma Miss Brasil, mas teria, indiretamente, uma Miss Universo. Também gosto da Miss Espanha, Miss Jamaica, Miss Chile, Miss França, Miss Laos, Miss Colômbia. No entanto, ainda não conheço as meninas pessoalmente, talvez, quando as conhecer, mude de opinião. A Miss África do Sul, apesar de baixinha, é linda também.


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